É bem verdade (ou ilusão farmacoquímica) Que quase já não sinto o mefítico da multidão que me rodeia onde quer que eu vá, O futum de sua festiva ignorância, O esterco moral que lhe é a vestimenta da moda, Que lhe é a grife falsificada mais desejada.
E isso, É bem verdade (ou ilusão farmacoquímica), Concede-me oásis momentâneos De tranquilidade/tolerância Durante as 24 cada vez mais longas horas do dia.
Por outro lado, Já não sinto mais o cheiro sanguíneo Do pôr-do-sol A escorrer, a menstruar-se Por cima do dia estéril. Meu pau já não acorda para a buceta da madrugada.
Não sinto mais o coquetel alcoólico da mistura da chuva, Com o asfalto esburacado, Com o olor da padaria recém-aberta, Com as flores caídas do ipê, da paineira e do jasmim Que atravesso rumo ao meu ganha-pão.
Não percebo mais a garoa A neblina, O roxo da quaresmeira. Fiquei daltônico Para o alaranjado do flamboyant, O branco do jasmim, O amarelo da sibipiruna, O azul da trapoeraba.
Fiquei blindado e insensível À falta que ainda sentia de ti. É bom andar sem ansiedades Sem nós górdios no peito Sem ânsias de vômito e de pranto.
Talvez pior Andar sem as saudades de ti, Sem perceber tuas cores Sem te ter em minha imaginação (Foi-se, a minha imaginação). Sem te ver nas quaresmeiras, nos flamboyants, nos jasmins, nas sibipirunas, nas trapoerabas. Fiquei daltônico também Em relação a ti.